Este texto é uma confissão. Poderia ser falado num divã ou em confidência, mas para as delícias deste dia prefiro deixar aqui, pra quem quiser ler.
Com o tempo, aprendi que não existem culpados lá fora. É que a gente tem o dom de apontar o dedo quando as coisas não dão certo. Culpamos os pais, a família, o país, Deus e o diabo. Apontamos nossas misérias ao universo, como vítimas de uma separação de pais, uma escola que não era tão boa, e assim vai.
To reavaliando , reaprendendo que somos os únicos responsáveis por nossas escolhas. E isso desde bem novos. Não adianta culpar, somos sim. Mas não é tão fácil fazer uma autoanalise e admitir isso. Só que tem horas que temos realmente que pegar os remos nas mãos, senão o barco vai dar lá no precipício, vai bater nas rochas, ou mesmo afundar. Chega um momento na vida, que o "mimimi" e "nhenhenhe" tem que ficar pra trás, e a gente precisa ser autor da própria história.
Sou carioca. Amo meu Rio, suas praias e belezas naturais. Tenho 37 anos de orgulho deste calor, do céu tão azul, da gente simpática que nasce aqui. Gosto do sotaque desse povo, e de dizer: "Sou Carioca da Gema". Desde pequena, sou apaixonada pelos pontos turísticos da cidade e encantada pelo Pão de Açúcar. Quando meus pais falavam e apontavam para os dois morros, eu pensava que lá em cima, as nuvens eram de algodão doce. Que tudo era muito gostoso, que tinha creme, doce de leite e balinhas por cima!
O tempo passou, e descobri que as nuvens não eram doces, mas que a natureza que abrigava o bondinho era majestosa, perfeita, digna de ser um dos cartões postais mais lindos do mundo todo! Difícil saber de uma criança do Rio, que nunca desenhou em azul, marrom e verde as belezas desse Pão adocicado!
No entanto, o absurdo dessa história é que apesar de todo o encantamento, só subi o bondinho no final do ano passado, à noite. Já tinha 37 anos. E porquê? Ah, eu culpava tudo... família, marido, namorado, filho, tempo,dinheiro... Não queria ir sozinha, esperava, esperava, esperava...
Há algum sentido nisso? Não vejo. Tenho 2 pernas, trabalho e sou capacitada a andar sozinha. Usei a minha capacidade, vontade ou pelo menos bom senso? Tanto tempo desejando algo tão dentro das minhas possibilidades e simplesmente não fiz. Não fiz por muitos anos, espelhando nisso muitos outros atos.
Fato é que em novembro de 2013, fui com amigas para um show no Morro da Urca, e subimos o primeiro morro. A sensação foi linda, e a noite incrível. Mas hoje, de dia, após meu trabalho voltei lá. Ah, o dia no Rio estava lindo, de um azul perfeito. Não vi uma nuvem no céu. Esperava por duas amigas, como demoravam, comprei meu ingresso e subi sozinha., dessa vez de dia, absorvendo o máximo que podia de toda aquela exuberância ao meu redor.
Levo cerca de uma hora ou menos para sair da minha casa e chegar ao bondinho . Pessoas do outro lado do mundo, visitaram e revisitaram a beleza da minha cidade e eu apenas desejando... Então hoje, foi o dia de curtir e repensar. Enquanto minhas amigas não chegavam, devorei o mar, o céu e as montanhas com meus olhos. A impressão que eu tinha é que estava realmente em um monte de doces, e que eu me lambuzava!
Lilian e Elisete chegaram com suas filhas, e tivemos uma tarde realmente deliciosa. De pernas pro alto, desfrutando o poder que àquela paisagem nos transmite. Ainda não tinha subido o segundo morro, e quase temi. Foi ainda mais gostoso, se é que podia ser possível!!! Eu estava vivendo os mesmos momentos que as duas crianças que estavam conosco, de 7 e 9 anos. Rimos muito!
Quando o Astro Rei foi se esconder atrás das montanhas, sentamos para contemplar. Não sei se há como se acostumar com tanto poder. Percebemos o quanto pequenos somos, como são pequenas as coisas, e nos questionamos porquê sofremos tanto em vão.
Por do sol no Pão de Açúcar
Depois, nos encantamos com as cores que se formavam enquanto o sol se escondia, e as luzes da cidade criando vida, e se tornando um pisca-pisca sem fim!!!
É bem possível que você ache graça da história, talvez já tenha subido o bondinho dezenas de vezes... Mas é que esse conto real tem um significado ainda maior. Quantas vezes nos negamos alegrias para esperar que o outro nos acompanhe, que àquela pessoa queira o mesmo que nós, que nos entenda? O outro pode ser marido, mulher, família, amigos, emprego... Quantas vezes nos sentamos , enquanto as asas dentro da nossa roupa, sacodem e doem, pedindo espaço , para alcançar o voo de sua própria natureza? Deixamos um esporte, uma amizade, recusamos a viagem dos sonhos... enquanto isso os cabelos ficam brancos, os olhos escurecem, e os anos passam, e se espera...
Espera quem, o quê, porque?
Espera quem, o quê, porque?
Há tantas alegrias possíveis!!!! A vida é ligeiramente breve, com toda redundância que a frase possa mostrar. A vida corre. Um dia de cada vez, com as alegrias possíveis. O que eu fiz hoje, me emocionou e elevou a alma, poderia vir acontecendo há muitos anos. Não me faltou perna, nem dinheiro, nem condução, nada. Eu me neguei à minha alegria, e só posso culpar a mim mesma por isso.
São quase duas da manhã, mas estou escrevendo linhas em todo meu corpo desde que paguei o ingresso.
Sabe quando um dia vale a pena? Esse valeu! Que a gente pare de recusar as alegrias que a vida nos oferece. Algumas são absurdamente possíveis. Pare de aguardar, pegue os remos nas mãos, coloque o barco pra navegar no sentido que te faz feliz.
Um comentário:
Entendo bem esse seu sentimento. Fico feliz que você tenha tido a oportunidade de conquistar o seu bem precioso,ainda que pareça para algumas pessoas uma coisa boba. É isso mesmo que a gente tem que fazer, é ter coragem de arriscar em pequenos atos para sermos felizes. Que você faça outras visitas ao pão de açúcar e que elas lhe proporcionem tanta felicidade quanto essa.
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