domingo, 30 de junho de 2013

Colchão para Cinco


Conheci Bárbara, em uma de minhas visitas a favela de paus,próxima a creche que trabalho, construída na rua e escorada no muro de uma empresa de ônibus de viagem.  Eram 9 horas da manhã, e aquela mulher magrinha estava rodeada de crianças. Um pequenino estava agarrado a seu peito murcho, sugando com fome o leite e o sangue da mãe.

Perguntei porque as crianças não estavam na escola. Ela respondeu que não tinha registro.

_ Quem não tem registro?
_ Eu. - respondeu Bárbara - então não posso tirar os registros dele.

A mulher me apontou seus filhos, Davi de 7 anos, Karina de 4 anos e o bebezinho de 1 aninho. Nenhum deles havia frequentado escola. Também não tinham registro de nascimento. Aquela cena, as palavras invadiram minha alma de forma profunda e perturbadora. Embora nenhuma das crianças tivesse idade para ser matriculada na creche que sou gestora, pedi que ela fosse até lá para que eu me informasse sobre como poderia ajudá-la.

A casa de Bárbara era um quarto de madeira, construído ao lado de um contêiner que se escorava no muro. No quarto havia um colchão no chão, e ao lado uma caixinha com os pertences de todos eles: dela, dos 3 filhos e do marido que trabalhava. Não havia banheiro, nem torneira, nem vaso sanitário. Também não havia comida. 


Casa de Bárbara, e seus pertences dentro da caixinha


Em menos de duas horas, ela apareceu na unidade. Ela e seus pequenos. Ofereci lanche a ela e as crianças. Pedi que se sentassem. Liguei para o CRAS, para o Conselho Tutelar, para Defensoria Pública, para CRE, para o CMS. Todos se solidarizaram , mas era preciso ação. Uma amiga da creche a levou para todos esses lugares, e ela conseguiu ter seus filhos matriculados.



Eu, segurando as crianças,Davi ao lado e Bárbara atrás da cadeira. 
Lília, adjunta da creche ao lado direito da imagem.


A questão da certidão de nascimento dela ainda é complicada, pois a mãe dela, falecida, também não tinha. Mas não desistiremos.

Hoje, duas semanas após meu encontro com Bárbara, podemos ver um pouco mais de esperança.
Recolhemos doações na creche e com parceiros, arrecadamos alimento, e seus filhos já estão na escola e na creche. Dr Pablo, do CMS do Caju, vacinou os pequenos, pois a mãe, embora com o cartão de vacinação dos menores, único documento que recebeu da maternidade, encontrava barreiras para vaciná-los. 

Ainda falta tornar esses brasileiros, cariocas, verdadeiros cidadãos. A dignidade para suas vidas precisa ser alcançada. Não possuem identidade, moram onde não há endereço, dormem ao lado de ratos, e fazem suas necessidades em latas. O que o marido ganha não dá para sustentar a família com alimentação durante o mês.

O bebê precisou ser afastado da creche por um tempo pelo doutor, pois sua pele estava muito doente, precisando de cuidados básicos de higiene. O Dr deu amostras grátis para tratamento, e eu lhe disse da dificuldade de cura , pois não havia banheiro para tomar banho.


Eu, segurando o menorzinho


Essa é apenas uma história, das tantas que tenho descoberto ali, com aquele povo sofrido e que está tão perto de mim. Caju, centro da cidade. Inimaginável.

E no meio disso tudo ocorre a Copa das Confederações. Nada teria demais se a prioridade fosse os brasileiros, sua vida, sua saúde, sua educação. Mas enquanto a riqueza é exibida nas poltronas confortáveis do Maracanã, Bárbara, seu esposo, Karina, sua filha, Davi, seu filho, e seu bebezinho compartilham o mesmo colchão rasgado.


Foto interna do Maracanã

Minha consciência me impede de vibrar com a seleção. Eu gosto de futebol, mas gosto mais de saber que o governo do meu país se importa mais com as pessoas do que com o futebol. 


Eu estou falando de  apenas um caso no Rio de Janeiro, na Cidade Olímpica. Não podemos imaginar pelo Brasil afora, em suas secas e enchentes quantos casos existem... 

Como comemorar a alegria de uma Taça, sabendo que todos os dias pessoas morrem, sem ter o que comer? E muitas vezes, irão à terra sem ter conhecido a dignidade.




Peço doação de roupas, principalmente para bebês e crianças para esta comunidade. Também cestas básicas. Quem puder ajudar, com parcerias, ou o que for, me envie um e-mail e entro em contato: ruthalbanita@gmail.com



2 comentários:

Neilda, Rioeduca - 8ª CRE disse...

É preciso mesmo mais do que apenas indignar-se, é preciso ir em direção ao próximo, oferecer-lhe o ombro, o pão e a esperança! Dignidade hoje e sempre para essas crianças indefesas e reféns da pobreza e da injustiça social. Conte comigo! Quero ajudar!

Hozama Moura disse...

Amiga, meu choro tá entalado na garganta depois de ler essa postagem... Vc é um anjo para essas pessoas! Deus lhe abençoe e lhe proteja! Te amo!