sábado, 23 de fevereiro de 2013

A Alma das Casas


Concordo que o título parece estranho. Mas até este momento, é o que mais reflete o que sempre me atraiu nas casas e construções.
Há pesquisadores que afirmam que objetos tem alma, sentimentos...

Minha questão é outra.  Mas que as casas tem alma, isso têm.




Lembro que comecei a me interessar por olhar casas desde adolescente. Curiosa, queria saber o que havia nas casas, algumas tão belas, outras desgastadas. Pensava em como seria minha própria casa, quando eu construísse meu lar, até então, para minha romantica interior, o motivo de serem construídas.
Casas abrigam lares.


Tenho uma vizinha, com terreno grande, a casa  enorme, com 3 andares . Quando criança vi que a filha da dona, que se casaria, começou a construção de uma outra grande casa no mesmo terreno. Mas,algo deu errado. A construção erguida parou nos tijolos, e após uns 20 anos, continua lá, tijolos e mato que cresceu por dentro e fora da casa. Todos os dias quando vejo inevitavelmente a construção, casa de bichos, penso nela como sonho destruído, amor desmoronado, incompletude, imperfeição, dor...


Quando ando no Centro do Rio, e vejo aquelas portas imensas, construções tombadas pela sua importância histórica, faço viagens internas, e imagino as famílias daquele tempo...


Quando alguém decide construir uma casa, ela a imagina, sonha, gasta, compra, deseja , faz planos, imagina onde ficará o sofá, se a cor combina, a mistura das cores, a janela que se abrirá, a varanda que terá flores... os beijos que encherão o ambiente, as crianças que correrão pelo quintal,,, 





Moro hoje na casa que cresci. Enquanto casada morei 13 anos em outro lugar. Lembro quando bem pequena vi pela primeira vez a casa da infância... Era térrea, uma mangueira imensa, na qual meu pai fez um balanço de pneu, e grama,,, A casa dos sonhos para um casal e seus dois filhos (até então). Pequena, e imaginativa pensava que debaixo daquela grama poderia haver tesouros, tal como ouvia nas histórias que minha mãe me contava antes de dormir.


Mas meu pai desejou algo melhor para nós, e no lugar da mangueira, construiu uma piscina, a casa ganhou outro andar para que tivéssemos nossos quartos, e a churrasqueira foi colocada no terraço. E nesta casa, projetada com sonhos , ideias e ideais morei meus 18 anos, idade que me casei. 


Eu brincando ao no quintal de casa aos sete anos


No entanto, quando deixei a casa, nem tudo era igual. A grama desaparecida não foi a culpada, mas os sonhos impregnados nos tijolos, tiveram detidos sua vida..


Penso nas casas em ruínas... quase que condenadas,,, Alguém as desejou e construiu. Cores foram escolhidas, dinheiro gastos, comemorações feitas, mas... e os lares? despedaçados.





Creio que a ruína física de uma casa, é o espelho de um lar amargo,
Há casas pequenas, miúdas  e que faltam sorrir pra você. É possível sentir a energia que exala a felicidade, ainda que na simplicidade...

Plantas e flores na janela denunciam que lá dentro há pessoas que acreditam na vida,
Pintura nova, de tinta nem tão cara, e piso, pode ser até  de cimento,  varrido e limpo, parecem orgulhosos de seus autores, donos.





Vemos em todos os lugares,mansões , fábricas, sítios e fazendas largados à própria sorte, sofrendo as perdas de algo que não deu certo. O amor que falhou. O perdão não dado. O fantasma da morte não espantado. A tristeza da falta do abraço, e  a espera por quem nunca vem, e quando vem, era preferido que não viesse.


"se as paredes tivessem ouvidos..."


Creio que tenham.


Há 6 anos meu casamento acabou e depois de treze anos morando na mesma casa, voltei para meu primeiro lar. Local no qual ,tudo reflete a infância de um tempo feliz.

Minha mãe , que mora no andar de cima, dá vida a casa, e contagia os outros recantos. Em sua varanda, há flores, e ela acabou de trocar o piso, um piso que já estava encardido pelo tempo e pelo peso das pisadas.
Ela está feliz! Nós também!


Minha casa tem história. Tem a minha história, a de minha mãe, do meu pai e meus irmãos.
Sobrinhos, ex cunhadas, pessoas que aqui deixaram sua marca.
Cada um pode contá-la de um jeito.

Eu lembro que via as estrelas pela janela do meu quarto.
E foi nela que brinquei com minhas bonecas e amigas.
Nesta casa dei meu primeiro beijo. Doce.


Mas há ainda marcas, marcas que as paredes não contam, mas sabem.
Choro que viram, sentiram,,, um desespero contido. E a esperança que a resiliência produz.


Passo todos os dias, de ônibus, em frente a casa que morei enquanto casada.
Acho que aquelas paredes, e portas e janelas não me amam, pois ao vê-las não é amor que sinto. É apenas a sensação de vazio. E houve um tempo que  coloquei lá, flores na janela.


Sou feliz onde estou, pois aqui fui e sou feliz.
A casa sofreu mudanças:  de uma, se tornou três. Aqui habitam 3 famílias.
Mas o coqueiro ao lado da piscina continua, e como continua crescendo, acho que está feliz,

As paredes as vezes me sussurram, mas entendo que suas almas percebem que apesar dos pesares das mudanças , os sorrisos que escutam minimizam as durezas de sua história.


Meu sobrinho na varanda da casa da minha mãe



Casas abrigam lares.
Não importa se é uma casinha ou uma mansão.
Se é no morro, ou de frente pro mar.
Quem dá vida às casas  são os sorrisos, os choros em abraços, as perdas entendidas, as flores na janela.



Desejo que a alma de minha casa, que também é casa de meu irmão, e de minha mãe, cada qual com sua família , seja uma alma satisfeita, que carrega suas marcas, como todos nós, mas que sabe que tem sido reconstruída com muito amor, flores, e crianças.


Sim, sem dúvida, as casas têm almas. 



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